só perdi.
mas, com gosto.
alias, algumas eu ganhei...
outras eu perdi...
mas todas justas.
eu vou
continuar assim
com o dedo amarelo
e
com o sorriso
amarelo.
eu vou continuar
aqui
cercando comprimidos:
dormir
é o que cura
a ausência.
estarei
do mesmo lado
quando você
voltar.
estarei com as mesmas
vestes,
as mesmas
maneiras,
as mesmas
torturas.
eu estarei
pra sempre lá
mesmo quando
estiver aqui.
distante.
estarei pensando
na tua vida
pequena
e nada intensa.
estarei contrapondo
a minha grandeza
na sua humildade.
estarei esbarrando
na tua falta
de loucura
que me mata
e me dói.
pois enquanto
eu viva estiver
serei a mesma
com o mesmo dedo amarelo
e o mesmo sorriso
e os mesmos cabelos
e a mesma falta de graça
na minha total
falta de
maleabilidade.
Era maio. Inverno tão frio que, durante o banho, deixava o mijo escorrer-lhe entre as pernas: estreitamente a única coisa quente em seu corpo nu, tremulo. Não era mês para propiciar aquela gélida sensação... São Paulo estava mostrando-se menos acolhedora do que nunca, mais concreta, mais distanciadora. Agora ela passava a chegar em casa e encontrar um imenso vazio. Antes tudo era convidativo, aconchegante e tinha o calor de um respectivo lar. Hoje a televisão encontrava-se no chão, apoiada numa caixa de papelão marrom. Os pratos estavam carentes de armários e com isso recolhiam poeira sobre a única mesa do lugar. Ela repousava no sofá devido aos problemas respiratórios que tanto atormentavam seu sono, afinal, não possuía mais uma cama, apenas um colchão.
Fitou aquela angustia expressa em coisas avulsas distribuídas pelos cantos e sacou a Polaroid que herdou do pai de dentro da caixa de relíquias. Resolveu presentear-se com fotografias daquele inferno por ela vivido. Avida ficava mais bonita com aquelas fotos tonalizadas pelo ar antigo proporcionado pelo equipamento. Cercou o piso com as imagens da sua derrota. Embebeu uma dose de uísque causando desconforto para sua garganta, pois Catarina não se servia com nada alem de vinho tinto seco. Despiu-se. Fotografou a vulva, os seios, os pés, os olhos... espalhou tudo pelo apartamento escuro e após outro gole de um Bucchanan’s ganhado por Ciro, amigo de Alberto, recostou-se numa poltrona suja e, em alfa, descansou.
Iria recordar a sensação daquelas unhas tempos depois. Sentiria o toque de cada digital sobre os pelos cerrados debaixo, até o redor do umbigo, até a sobrancelha protuberante daquela face, que em face da saudade, lembrava-se de fatos ocorridos anos antes. Viria a ser uma daqueles saudosistas, que presos em sua eternidade não esquecem o sofrimento pois posicionam o êxtase acima de qualquer proposta.
Aqui só tem retalho
Dourado
Vermelho
E verde.
Aqui só tem retalho
De preto
De branco
De gente.
Tem “samba de preto véio
E samba de maracatu”
Aqui tem umbanda
Tem candomblé
Tem Iemanjá
E mainha pra me acompanhá...
Tem gente mostrando
A pintura no olho
Refletindo riqueza
Exaltando a beleza
Desse pedaço de chão
Bebendo o mar
Chamando o povo
Gritando samba,
Sambando o grito
Dos excluídos
Pois “só quem sabe onde é Luanda
Saberá lhe dar valor...”
Aqui tem construção no mato
Criança rimando
As falas de um cancioneiro
Cor de jambo
Que dança, que sacode o pé ali
Que decanta a África
Explora o batuque
E eleva nosso espirito...
Aqui tem gente que molda a gente
Que bronzeia as nossas areias
Que comove o menino
Que bete bola em Copa,
Que faz malandragem na Tijuca...
“Chegou a hora dessa gente bronzeada
Mostrar seu valor...”