sexta-feira, 2 de outubro de 2009

eu sai ao sol, pupilas dilatadas e dores. andei alguns quarteirões e encostei no ponto. esperava há mais de cinco minutos e a senhora escorou em meu braço. sentou-se.
olhou para mim, falou causos sobre o marido - o primeiro, o segundo, o terceiro marido. dissera que vivera uma vida de majestade até vinte e três anos atrás. roubaram-na tudo. o governo viria a tentar solucionar o problema, mas já passava tempo demais e a velha estava desesperançosa.
a velha cheirava bem; cheirava a velho. o lixo ao lado da velha cheirava mal. a negra sentou-se daquele lado, e cedi meu lugar para que ela não sofresse com o odor medonho que vazava do xorume.
levantei-me junto as outras quatro mulheres que esperavam o ônibus junto a mim. subimos, e o motorista errou o troco. eu estava cansada e decidi sentar-me e não questiona-lo por dez centavos a menos.
o ônibus para, vidas entram, vidas saem.
mais hora, a gorda esquisita sentou-se ao meu lado. desejava te-la longe o mais rápido possível. sentia a sensação de estar em um forno: um mormaço desconfortável controlava a ira de todos os passageiros. inclusive a minha.
a condução rodou mil voltas, e quando eu pensava chegar ao meu destino, o destino mudava. passei por meios desconhecidos e senti arrepios. ademais, uma criança chorava ao meu lado e a mãe berrava. eu, como boa detestadora de crianças, mantinha-me firmemente controlada para não tornar aqueles momentos ainda mais infernais do que já estavam sendo.
quando a situação esgotou-se, desci. mesmo longe; faltavam seis quarteirões para chegar em minha casa, porém, qualquer andança seria melhor do que aquele purgatório de almas feias e pobres.
andei pensando em musicas e senti que a rua fede. os gatos fedem e as pombas fedem. só não fede o velho que lê um livro de paginas brancas no alpendre. ele não fedia, ele tinha um lar.
os botecos fediam, os cachorros fediam. os corpos fedem.. a vida não é sumariamente agradável em nenhuma circunstancia. a putrefação orgânica acontece.