quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Pensava que viver por todos esses anos naquele lugar, infestado de sombras e fumaças e cheiros era um extremo atraso social de sua parte. Catava aqueles lixos todos, cheios de luxo, jogados pelo pessoal da Tijuca, do Leblon. Pensava que aquilo era resto de vida, matéria decomposta em sentimentos, amores estilhaçados, crianças peladas, nuinhas de afeto.
Pensava sempre nas crianças, que viviam de ir a colégios caros, com roupas cor de vinho e sapatos coloridos. Pensava sempre na vontade que tinha de que algum dia, por ventura, uma delas viesse a olhar o mundo e desejar ajudar aqueles que se assemelhavam a ele. José Paulo nunca teve escolha, viveu e morreu para sempre ser o afago da riqueza do Rio de Janeiro. Viveu e morreu sem ser notado. Viveu e morreu com seus chinelos marcados na areia de Copa.
Limpou a sujeira imunda, fétida e descabida daquela sociedade carioca, que bronzeada, levava alegria as telas de TV. Fazia festa de carnaval quando o povo passava fome, cheirava padê e comia na terra.
José Paulo higienizava a escória da escória, mas viveu e morreu apenas deixando os chinelos marcados na areia de Copacabana.