sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Leões não transam com Z


Olhando para ti e reparando em nossa conduta temível, percebi que leões fazem amor perdidos numa selva de savana, onde são entronados, numa selva onde o mato aparado parece pelos cerrados. O cenário acaba sendo completamente, ou em grande parte, pubiano. Leões se amam por um corpo enorme sem respiração, feito de terra e mato. Leões transam rugindo, gritando, libertando seus cabelos para fora e descabelando-se pois, de falta de pelo, não morrem jamais.

E, assim, de frio também não morrem.

Eis que olhando para dois leões e olhando a mim mesma e olhando a ti, realcei na vida um espelho que se quebra e não retorna. Vejo que a ferocidade implica em inúmeros rugidos aterrorizantes, assim como o amor constitui-se mediado por muitos gritos sedentos de algo que só amantes compreenderam. Hoje não busco mais a compreensão de mim, para mim mesma, nem de nós, muito menos daqueles que me são estranhos. Não esquisitos, mas estranhos desconhecidos que não me afetam, mas pretendem desfrutar de mim. Estes estranhos não tem educação, não batem na porta e não pedem licença. Tampouco silenciam.

Como eles seduzem-se uns aos outros sem saber, sequer, qual é o único par para cada um? Eles não se importam e ainda afrontam a todos como se fossem unos, pois leões não se reconhecem como indivíduos - apenas como bichos reis, onde fêmeas e machos são criaturas opostas que atraem-se pela força da natureza intocada, pela pele de seres humanos vestidos. Antes, despiamo-nos todos.

Nus.

Até quando a vergonha enfartou a todos como que num golpe genuíno de mestre samurai. Nem espada amolada seria tão certeira quanto a conta que a vergonha e a despretensão nos tomou. E causou a todos nós, que passamos a vestir uns aos outros ao invés de amarmos uns aos todos, como Jesus nos ordena interino.

E no caso do sexo entre leões, as coisas acontecem como no cotidiano ordinário desses felinos. A fêmea logo toma partido de si e de todo mundo, encontra-se voluptuosa, exalando coisas que não se nomeia fora de êxtase. Ela exala. Ela gosta de ser vista enquanto recebe seu macho de corpo inteiro, deitada e pelada. A leoa gosta de ser vista, implora para que todos fiquem satisfeitos através de seu gozo. É a satisfação que penetra pelo olhar, aquela intensa que dispensa o toque. Pois ela não nega nada, nunca.

Entretanto, o leão que não trabalha e apenas prostra-se perante o pai sol, reclama e, rabugento, decide uivar, além de rugir, uivar, além de gemer, para que todos se espantem e interrompam o filme de sua fêmea deleitando-se. Filme não é permitido. Documentário, proibido. Não é autorizado que leões ou humanos desconhecidos apreciem esta transa transcendental. E isso tudo por que, mesmo caçando e alimentando através de seu leite e garras, a leoa ainda é uma reles fêmea. E dessa forma, o leão pede para ser enganado.

Ele implora para que aquela criatura parideira o engane, o tape os olhos contra o mato cerrado.  Implora para que suas unhas entrem na carne dele, sangrando e ardendo e sangrando mais um pouco. E ele se diz rico; se diz tão lindo e tão rico por portar, nos pelos, fios de ouro finíssimos e leves.

Ela só pretende obter reconhecimento por sua força. Ou talvez esta não seja a esfera superior atingida pelos devaneios solitários de uma leoa no cio. Pois ela sempre desejou e sempre desejará a beleza. Ser a mais bela das belezas naturais do mundo. Ela requer apenas o gozo pelo desbunde de uma cena infinita, para que sua mente de caçadora maior descanse.

Dois leões fazendo amor completam uma dança. Ele tenta pela força. Ela dá por que gosta. Eles gemem. Eles até se beijam batendo dentes. Dois leões fazendo amor completam o espetáculo mais intenso que a natureza deste planeta, então dourado, já foi capaz de reproduzir cinquenta vezes ao dia.

50tinha, ou seja, um número modesto para penetrações diárias.

A fêmea copula formosa a cada quinze minutos. E a cada 15 minutos, ganha muito amor em três minutos, às vezes até em dois, ou às vezes num. Mas a leoa deita-se, convida e termina. Quando finaliza, desdobra-se. Estica-se, coça-se no mato para equilibrar energias entre a natureza inanimada e a natureza viva de mais outros leões. Pois os machos preferem uma só fêmea. Quando quem desempenhou o papel de delegar-se a todos os outros machos foi a mulher leão, bicho leoa.

Entidade que geme e grita.

Leões nasceram pelo gemido e através dele morrerão. Leões vivem e falecem pelo amor ao gozo eterno.



Unem-se e jamais separam-se. O trabalho destes é sério e deve ser exercitado com louvor. 

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Foto do projeto mais maravilhoso do mundo:
http://ngm.nationalgeographic.com/serengeti-lion/index.html