quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

CAS 288.

"(...) Recordando essas coisas enquanto preparava o baú de José Arcádio, Úrsula se perguntava se não era preferível deitar de uma vez na sepultura e que jogassem terra em cima, e perguntava a Deus, sem medo, se de verdade achava que as pessoas eram feitas de ferro para suportar tantos padecimentos e mortificações; e perguntando e perguntando ia atiçando sua própria confusão, e sentia uns desejos irreprimíveis de desandar a dizer palavrões e xingamentos como se fosse um daqueles forasteiros, e de se permitir enfim um instante de rebeldia, o instante tantas vezes ansiado e tantas vezes adiado de mandar a resignação à merda, e cagar de uma vez para tudo, e arrancar do coração os infinitos montões de palavrões que tinha precisado engolir num século inteiro de conformismo.
- Caralho! - gritou.

(...)"

Gabriel García Márquez

24/08/1992 00:28

"(...)
Ou talvez a morte esteja me mandando alguns sinais?

Outro dia, fiquei pensando no mundo sem mim. Há o mundo continuando a fazer o que faz. E eu não estou lá. Muito estranho. Penso no caminhão do lixo passando e levando o lixo e eu não estou lá. Ou o jornal jogado no jardim e eu não estou lá para pegá-lo. Impossível. E, pior, algum tempo depois de estar morto, vou ser verdadeiramente descoberto. E todos aqueles que tinham medo de mim ou que me odiavam quando eu estava vivo vão subitamente me aceitar. Minhas palavras vão estar em todos os lugares. Vão se formar clubes e sociedades. Será nojento. Será feito um filme sobre a minha vida. Me farão muito mais corajoso e talentoso do que sou. Muito mais. Será suficiente para fazer os deuses vomitarem. A raça humana exagera tudo: seus heróis, seus inimigos, sua importância.

Os filhos da puta. É isso aí, me sinto melhor. Maldita raça humana. É isso aí, me sinto melhor.
(...)"

Charles Bukowski